Tudo o que vale a pena não está aqui.



Biblos #7


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Gonçalo M. Tavares dizia há uns tempos numa entrevista que a ele o apoquentavam os pares, as combinações repetidas que a nossa língua vai produzindo. Interessa-lhe sobretudo, enquanto criador, evitar esse território comum a noventa e nove por cento dos que escrevem. O que ele designa por pares (não tenho bem presente o termo, a ideia seria esta) são aquilo que o olho mais treinado detecta como lugar-comum, defeito de escrita. Não deixa de ter razão. Mas imagino que deva ser difícil por vezes contornar o previsível trajecto das palavras. Repetir o que já foi escrito é o destino comum de quem se aventura. (Outro cliché: criar novo é impossível). Em Gonçalo Tavares, esta estratégia tem efeitos secundários. De tanto contorcer a língua, arrisca-se a cair no lugar-comum do artifício estéril, e a produção abundante que o caracteriza não o ajuda na tarefa. Um conjunto de milhares de palavras em permanente ziguezague, esquivas, adiando os previsíveis encontros que a sintaxe obriga, pode redundar num absoluto vazio de conceitos. O referente dos enunciados é muitas vezes nublado pelo fogo-de-artifício que o rodeia. Nem sempre é assim, e ainda bem. Um dos últimos livros dele, "Histórias Falsas", consegue ser quase perfeito, sem aparas. Em todo o caso, intelectualizar demasiado o ofício de escritor pode ser um erro: consigo adivinhar sempre um instinto primitivo, uma urgência absoluta na escrita dos autores que admiro. Algo visceral, da ordem dos sentidos. A razão apenas compõe o que esse instinto dita.


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