Escrever por desfastio, quando não se tem muito (ou nada) para dizer. Ou escrever por obrigação, porque é aconselhável manter um ritmo regular de publicação. Ou, no caso dos escritores de crónicas diárias de jornal, encontrar um assunto para encher chouriço e receber o chequezinho da ordem. Mais cedo ou mais tarde, acontecerá. Menos ao Vasco Pulido Valente, que tem sempre alguma bílis para destilar, ou ao Eduardo Prado Coelho, que no meio dos restos de notícias em que mais ninguém pega ou do modelo 1 de bajulação ao Carrilho ou ao Sócrates lá consegue alinhavar o textozito da praxe, sem falhas. Nos blogues, que no fundo são escritos sem nenhum objectivo concreto, e que servem na maior parte das vezes apenas para fazer festinhas ao ego mirrado do escritor, a futilidade reina. "Hoje encravei uma unha? Material humano para post. Acabei de ler a Recherche? Não, perdão... Acabei de
reler a Recherche? Toca lá a escrevinhar um post, mais intelectual que isto só talvez falar do prémio Turner de uma forma elogiosa". No limite, até uma sessão contínua de onanismo compulsivo pode ser matéria para tratar em post. (E não é que isto já aconteceu mesmo?). Não quero com esta atitude fazer juízos de valor sobre a actividade blogueira, mas a verdade é que é assim mesmo. Não me escapa o facto de um blogue ser um diário on-line, o que acaba por entrar em completa contradição com a definição de diário. Lembram-se do tempo em que a nossas irmãs fechavam a sete chaves os caderninhos para onde despejavam aqueles problemas de miúdas que tanto nos intrigavam e que nós a todo custo tentávamos ler? Que longe estamos deste tempo! (Ah, não se lembram... se calhar é uma coisa só minha). Bem, voltando atrás, deixem-me apenas dizer que futilidade não é uma palavra usada com sentido pejorativo, e que falar sobre a dificuldade do blogger na escolha de um tema para post acaba por resultar sempre na escrita do texto, como se pode ver pela amostra inclusa. Agora, não me acusem de hipocrisia, por favor. Incluo-me no grupo que quiserem (meus 8 leitores e meio), com toda a candura do mundo.
(A imagem foi indecentemente reciclada de um post mais antigo, e é uma reprodução do Narciso de Caravaggio.)
(Existem duas referências intelectuais ocultas no texto. Descubram-nas.)