Belo efeito este, as palavras que aparecem e desaparecem, de trás para a frente e da frente para trás, uma vez e outra a correcção surgindo no lugar do original canhestro, podia fazer isto a noite toda, suspendendo o texto no limbo a que foi condenado, entre erro e emenda, fantasmas dançando contra o branco do HTML, ao som de Cole Porter, como se fossem actores num filme dos anos 40, enquanto a guerra decorre longe, longe demais para soar no salão de baile, mas que ilusão será esta onde estou preso, imaginando que as imagens que estremecem são fantasmas de outra época, agora, como o baile de
The Shining, o extenso salão concentrado do lado direito da tela (ou ecrã, nunca vi nada de Stanley Kubrick na tela), imaginemos: na tela, sempre do lado direito, Jack Nicholson pede um copo a um barman que não existe, e ao fundo dançam os mortos. Local assombrado, este, evoco os meus mortos para o círculo do diabo, dois, apenas dois, mas os mortos que acenam do futuro ainda me aterrorizam mais, os danados. Toda a vontade do mundo não chega para desfazer o encantamento, agora tenho de lidar com eles, estão aí, aguardando a sua vez, mas ainda vivem. Em comboios, eles chegam, e descem para a plataforma onde eu espero. E temo. E quero fugir, mas não posso. Abraço-os, e nesse movimento apenas sinto os meus ossos, a orquestra toca agora mais alto, eu danço com os mortos, mas queria ainda que vivessem, espectros que existem no mesmo espaço que os sonhos, por vezes eles materializam-se e colocam as mãos sobre os ombros, e eu sinto-me reconfortado, e volto a amá-los e eles regressam à vida, lamento isto não ser um filme de Kubrick. Pela noite fora, ouço música, ecos de música fragmentando-se no tempo, à deriva. Notas apenas, silêncio.