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Literatura


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Não sei já quem disse que os maus escritores são fundamentais, o fundo contra o qual se destacam os bons. Bem, talvez a frase não seja exactamente esta, mas compreendo a ideia. Imagine-se um mundo sem bons escritores: onde apenas pudéssemos ler Paulo Coelho, Nicholas Sparks e quejandos. Sentiríamos falta dos outros, que alguns juram a pés juntos ser a verdadeira literatura? Não me incomoda o facto de alguns escritores venderem o que vendem, admiro mesmo os autores que, sem nenhuma publicidade institucional envolvida, conseguem concretizar o objectivo inicial a que se propõem: vender muito. Sparks, por exemplo: o seu êxito foi construído à custa do passa-palavra, e sim, ele é um autor predominantemente lido por mulheres, mas nada disto é acaso. Quando escreve, Sparks tem em vista este público muito concreto, e será admirável, para todos os efeitos, o facto de conseguir comunicar com o seu leitor ideal, escrever o livro que cumpre todos os parâmetros pelos quais se rege esse leitor ideal. Mas isto é mérito profissional. Literatura? Apenas um termo que está por ser definido, um rótulo que carece de classificação. Mais que Sparks e Coelho, que fizeram o seu caminho muitas vezes percorrendo circuitos alternativos a todo o marketing que envolve o livro, incomodam-me fenómenos como o recente de Maria Filomena Mónica: de entre aqueles que terão comprado o seu livro de memórias, empurrados por uma vaga mediática avassaladora, quantos o leram sem serem movidos apenas por um impulso voyeurista? Sintomático é o modo como o livro tem sido vendido: retrato de uma geração, bem escrito, revolução na literatura memorialística nacional. O que se compra: uma obra sem qualidades literárias nem relevância histórica. Basta ler, por exemplo, o "Diário Remendado", do nosso libertino relutante Luiz Pacheco, para conseguirmos obter as duas coisas juntas. Mas quem compra Luiz Pacheco, quem se atreve a elogiá-lo em público?
A ordem estabelecida diz que dificilmente se conseguirá obrigar o português médio a gostar de autores como Dostoievski ou Mann, e isto não é uma afirmação conservadora. Irrealista é pensar o contrário. Não falo de nivelar por baixo; mas atirar à cara, assim de chofre, a uma dona-de-casa amante de telenovelas e Nicholas Sparks, a "Montanha Mágica", é inútil e principalmente demagógico. Há um longo caminho a percorrer até chegarmos à completa literacia. E nem quando (e se) chegarmos aí, veremos o leitor médio a ler autores como James Joyce ou Samuel Beckett, Burroughs ou Artaud, por exemplo. Quem pensa o contrário ou é ingénuo ou não compreendeu bem a história.


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