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Em dia de descanso, uma dose de televisão como há muito tempo não saboreava, e ao princípio da noite uma espreitadela aos telejornais, hábito perdido sem pudor e sem culpa; não que os assuntos do mundo me tenham deixado de interessar, mas por vezes é difícil chafurdar e sair limpo do lixo noticioso que encharca as estações de sinal aberto, prefiro conhecer as notícias com 24 horas de atraso. Mas adiante, hoje foi dia em que aguentei mais de cinco minutos em frente ao televisor, com alguma boa dose de paciência, farto zapping e extrema dumbness provocada por um daqueles feel good movies tão típicos desta quadra natalícia, "Love Actually". E dado que esta amostra de náusea sentimental passou na TVI, mantive o aparelho sintonizado nesse canal de inspiração católica à espera do que se seguisse. Ao fim de cinco minutos, desisti; nem conteúdo, nem forma, nem critério de importância, nada bate certo no telejornal da TVI, se fosse emitido a partir do Cazaquistão e apresentado por Borat Sagdiyev a diferença seria pouca ou nula. Zapping rápido, o canal estatal fala de uma qualquer coligação da esquerda prontamente atacada pelo candidato do PC, não me interessa. Paro na SIC, apesar de tudo a redacção que prepara a informação do canal generalista é a mesma que está por detrás do canal de notícias, e isso nota-se. Uma reportagem que anuncia os debates que se avizinham, imagens de há dez, quinze anos atrás, Cavaco contra Sampaio no ecrã, depois Guterres versus Nogueira, depois Guterres antagonista de Barroso, finalmente Barroso frente a frente com Ferro Rodrigues, Santana Lopes e Sócrates, e, a culminar, o célebre debate na SIC-Notícias entre Carrilho e Carmona. Note-se, nada disto é arbitrário. Repare-se bem na sequência de políticos que desfilou pelas nossas televisões, e compare-se esta sequência com a evolução (negativa) da Economia nacional. Foi há dez anos, alguém se lembra? Economia florescente, boom consumista, PIB em constante crescimento, desemprego nos 4 por cento, Cavaco partira e fora derrotado de vez por Sampaio, Guterres governava com o apoio de uma maioria instável, porém segura do rumo que pretendia para o país. Agora, olhe-se só para o pardieiro onde vivemos, e prossiga-se tendo em mente os candidatos às Presidenciais: um clone do Cavaco que conduziu o país durante dez longos anos, um político sénior que perdeu a capacidade de discernimento em relação a si próprio, um poeta que caiu no erro de pensar que podia ser candidato presidencial de um partido liderado por uma figura como Sócrates (por onde anda ele? porque não apoia o candidato do PS?), e dois políticos de esquerda brincando à politicazinha de quintal, jogando urina para marcar o território junto de um punhado de eleitores que pouco ou nada conta para a eleição presidencial.
E sem esquecer que esta é a eleição que sucede a umas vergonhosas Autárquicas e a uma vitória nas Legislativas que colocou no poder com maioria absoluta um PS com o pior líder desde a sua fundação, um homem em que eu não confiaria em casamento a minha própria filha, se eu tivesse uma. O homem que se seguiu ao inenarrável Santana, político que me leva sempre, por muito que me esforce, a cair em eufemismos ao qualificar a obra que deixou. Percebe-se onde quero chegar? Se queremos entender a razão do descalabro do país, basta pensarmos nos políticos que se têm defrontado na TV desde há dez anos para cá. Se eu fosse paranóico, ou o Pacheco Pereira, acharia que o início da televisão privada em Portugal teria alguma coisa a ver com esta extraordinária degradação da vida política e consequente desastre económico e social da pátria, ou não tivesse a primeira televisão privada sido durante mais de dez anos dirigida por um homem que se gabava sem parcimónia da sua falta de escrúpulos, admitindo que tanto conseguiria vender um sabonete como um presidente (abusos do quarto poder). Mas enfim, talvez eu seja mesmo paranóico e isto não passe de uma coincidência. Ou então, um suave pesadelo tristemente parecido com as nossas vidas, um pesadelo do qual nos arriscamos a acordar demasiado tarde, eu bem sei como funciona a inércia lusa; já são novecentos anos a adiar.


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