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Director's Cut #3


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Million Dollar Baby (1)



Cedi várias vezes ao hábito da procrastinação antes de me decidir finalmente a ir ver este filme, em parte porque sou avesso a modas e unanimidades passageiras, em parte porque o tempo não o foi permitindo. O que me convenceu definitivamente acabou por ser o ciclo dedicado a Clint Eastwood que passou na RTP há duas semanas, quando aproveitei para ver uma das suas obras menores, Bloodwork; pensei, se isto é uma obra menor, tenho mesmo de ver o Million Dollar Baby. Entrei, portanto, na sala de cinema sabendo de antemão que este filme conseguiria ultrapassar o fabuloso Mystic River, o que por si só seria já façanha de relevo. Não me desiludi. (De passagem, esclareço que o meu gosto cinéfilo passa muito por este jogo de dito e visto, acredito que o meu julgamento acaba sempre por ser influenciado, de uma maneira ou outra, ou por aquilo que leio antes, ou pela obra anterior do autor. Posto isto, não acreditem na bondade das minhas apreciações. Estão marcadas irremediavelmente pela pessoalidade).
Não entrarei no lugar-comum do classicismo. Eastwood, apesar (bem, não é apesar, o western-spaghetti não pode ser mais americano) da sua incursão no western-spaghetti italiano nos anos 60, sempre foi um filho de Hollywood. Enquanto actor, dedicou-se ao Género (com maiúscula, sim) americano por excelência, o western, e passeou-se, nos anos 70 e 80, pelo cinema de acção de génese fascista, na série Dirty Harry. Como realizador, tornou-se especialista em filmes menores bem feitos, com algumas marcas de génio pelo meio, como é o caso de Bird, biopic competentíssimo sobre Charlie Parker, protagonizado por um actor subvalorizado pela generalidade dos especialistas, Forrest Whitaker (quem não gostou de o ver em Ghost Dog, por exemplo?). Em 1991, cria um novo sub-género cinematográfico, o western-geriátrico, com o seu magnífico e terminal Imperdoável. Seguiram-se anos de produção intensa, sempre mantendo um patamar mínimo de qualidade, até pegar num naipe de actores invejável, Sean Penn, Tim Robbins e Kevin Bacon, e realizar uma obra daquelas que deixam marcas na pele e nas entranhas. O que se repete de filme para filme é o minimalismo, a aposta na perfomance dos actores e na força do argumento, facto aliás não escondido por Eastwood. A câmara, impedida de interferir na visão do filme, de criar ruído entre espectador e história, não deixa no entanto de estar no sítio certo, no momento exacto, de modo a poder retirar o máximo do desempenho dos actores, a captar o gesto disfarçado, a emoção escondida, o pequeno movimento de revelação que cada sequência pode conter.

(Continua)


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