Cheguei a casa querendo deixar qualquer coisa aqui hoje, de passagem para amanhã. Escrevinhei no caminho (longo, longo) um texto que pareceu demasiado... bem, demasiado demasiado. Fica para outro dia o desenvolvimento, ou quem sabe se não. Não vou entrar pelo tema do texto sem tema, porque isso aqui já foi chão que deu uvas, penso acalmar a raiva do post anterior durante as próximas horas (enquanto durmo).
Desde que o meu filho nasceu que tento inventar a perfeita homenagem, mas transformar essa vontade em frases coxas e imagens roçando o mau gosto apenas cumpriria o desejo do meu ego literário. Colar a realidade com o cuspo da má literatura é o mais fácil (e medíocre) dos artifícios. Desgraças pessoais, acidentes na curva da vida e alegrias breves no intervalo do teimoso assédio do quotidiano não me enchem as medidas. Será defeito ou mínima virtude de espírito, no meio da abundância de feridas e mossas de carácter alguma qualidade me terá calhado em sorte.
Algum trabalho, preocupações, razões para achar que no limite apenas ele basta. Isso.
A história do acossado, Jean-Paul Belmondo de cigarro precário nos lábios, é mais do que a história de uma perseguição. Ele é o caçador, ele é a presa. Gestos nervosos, frases soluçadas, olhos que não fixam, apesar do desejo, assombro de Jean Seberg. A sombra de Jean Seberg, loura infantil. Ignorante das mãos que tremem. E ele não foge, não, encurrala-se como uma luz capturada pela sombra, a verdadeira, a que sabemos ser persistente, competente no seu ofício da ceifa. Da ceifa.
Pensei no acossado, via a desolação que era um espelho da sombra que respirava dentro, por mais que imagine o que está fora como um quarto onde todas as noites passeio tentando domar a insónia (que não sinto, tudo é estilo), não consigo aproximar a extensão que parte do meu coração da membrana que envolve o mundo. Ou o aquário, imagem que em tempos me serviu de forma simples, eficaz.
Quem poderia dizer que o que ele mais temia era o silêncio que precede a tragédia, o tempo suspenso, se sorria?