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Os Novos Conservadores?


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Afirma Pereira que não entende como os homossexuais podem defender uma instituição tão ultrapassada como o casamento, e até inclui correio de leitor assertivamente apoiando com uma citação de Foucault o dislate de Pacheco, caução inquestionável, de resto, por vir de quem vem. Quem esperava uma resposta ao violento correctivo aplicado por Osvaldo Silvestre no Casmurro, ainda a propósito da ridícula polémica do amiguismo no meio crítico, desenganou-se num instante, mas este facto não surpreende ninguém; o pedestal paira acima de tudo e todos, apoiado como está nos ombros dos que se curvam (os amigos, lá está) ao puro brilhantismo do intelectual que a Direita tolera. Cortando a eito, Pacheco debruça-se então sobre o tema do momento e enreda-se num matreiro jogo de enganos, acusando o discriminado de discriminação. Serve muito bem o argumento viciado de Pacheco à Direita que se afirma liberal, e assim se insiste uma vez mais no gesto de varrer as coisas desagradáveis para debaixo do tapete, que as tias velhas podem aparecer a qualquer momento e a casa precisa de estar impecável. Se desmontarmos a ideia de Pacheco, descobrimos uma ou duas coisas, no entanto: a candura com que ele se afirma Liberal, e Liberal no sentido em que se defende que o Estado se deve abster de interferir (e legislar) na vida privada dos cidadãos, quase que nos engana, mas calma, falta o quase. A questão é outra, claro. A institutição Casamento existe, e existe para garantir os direitos do cônjuge, principalmente os de herança, assistência médica e outras regalias não contempladas pela lei das uniões-de-facto. Quem protege os bens do indivíduo é o Estado, e este, através do Casamento, também permite que os mais próximos possam ter direito a usufruir desses bens privados. Existe portanto um contrato privado que é supervisionado pelo Estado, e esta supervisão apenas acontece porque o cidadão paga impostos e está dentro da Lei, a dinâmica do contrato é mútua. Aliás, todos os direitos e deveres associados à relação do indivíduo com o Estado regem-se por esta troca, as eleições não são mais do que a efectivação do acordo entre indivíduo e Estado, onde aquele deposita nas mãos dos seus representantes (os deputados eleitos) grande parte dos assuntos relacionados com o seu bem-estar. O que significa isto? Que de facto o Casamento não é uma instituição que tenha a ver com a vida privada, mas sim com a coisa pública, com o contrato que existe entre indivíduo e Estado e que permite que direitos e regalias sejam usufruidos em comum e já depois da morte de um dos cônjuges. Ora, aquilo que me parece é que o Liberalismo puro e duro defende uma espécie de anarquia, onde cada cidadão usufrui de uma liberdade que emana do poder que a acumulação de bens materiais confere. Certo? Mas quem se afirma Liberal sabe muito bem que isto não será possível, e muito menos desejável. O Estado deve continuar a ter a sua função reguladora da actividade do indivíduo, todos sabemos como o mito do Bom Selvagem é apenas isso mesmo, mito. Neste ponto, concordo com a Direita quando diz que o Homem é intrinsecamente corruptível, dominador, violento. Serei um pessimista de Esquerda. Mas falávamos de Casamento. Pacheco Pereira, como homem inteligente que é, sabe que, ao defender uma não-intervenção do Estado no caso do Casamento entre pessoas do mesmo sexo, está efectivamente a ser conservador. É evidente que a lei que existe agora está vedada à minoria homossexual, que deste modo não usufrui dos mesmos direitos de que a maioria heterossexual. E Pacheco Pereira defende apenas a manutenção deste status quo. Mais coerente será a posição da Direita abertamente conservadora, que pelo menos não corre risco de ser acusada de hipocrisia, característica tão comum nos que se afirmam Liberais. Antes marialvas empedernidos, homofóbicos e defensores da família tradicional (seja lá o que isso for) do que reaccionários encampotados, dissimulando com falinhas mansas exactamente a mesma posição que os conservadores defendem. É esse o problema dos intelectuais de Direita: julgam-se mais espertos do que os outros, os de Esquerda.


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