Nem todas as surpresas são boas, nem sempre os nossos autores de cabeceira cumprem aquilo que se espera deles. Mas quando se começa a notar um certo cansaço e falta de imaginação, torna-se preocupante. Finalmente li A Noite do Oráculo, de Paul Auster, e não percebi. Não porque o enredo fosse complexo, ou o livro denso (Auster não sabe o que isso é, e ainda bem), simplesmente não entendo o porquê desta obra, feita de narrativas encaixadas que nunca acabam, esboços de estórias que se prolongam para fora do romance.
O livro é prometedor no início, Auster lá vai tecendo a sua teia, aliciando o leitor com as coincidências do costume, os falhados excêntricos, as ruas de Nova Iorque. Há um escritor, casado, que recupera em casa (do quê, saberemos apenas quase no final), mergulhado numa crise criativa. Um dia, passeando pela cidade, encontra uma papelaria que vende cadernos portugueses. Decide comprar um, leva-o para casa e começa a escrever numa torrente que parece imparável. Depois, há a estória que ele decide contar no caderno, e há outras estórias que Auster coloca em nota de rodapé. Dentro da estória que ele escreve, existe um livro: A Noite do Oráculo. Penso que Auster quer que o romance se centre neste livro fictício, a narrativa de um homem que consegue adivinhar o futuro depois de ter sido ferido na 1ª Guerra Mundial, e que acaba por ter uma visão da sua mulher com outro homem, o que o vai levar ao suicídio. Até aqui, tudo bem. Leio, continuo interessado na estória. Principalmente porque sei que Auster acaba sempre por tirar um coelho da cartola, unindo as pontas do romance que parecem soltas. Isso, na verdade, acaba por acontecer. Tudo se resolve. Tudo está interligado. Auster, o escritor das pequenas estórias, das coincidências que acontecem na vida de todos, vira a agulha e decide escrever um livro sobre a predestinação. Boa ideia. O problema é que a solução do livro deixa muito a desejar. As estórias encaixadas são abandonadas, em favor da narrativa principal, e esta tem um desenlace banal, surpreendente por vir de quem vem. Para além de outras fraquezas: personagens estereotipadas, situações redundantes no avanço da narrativa, ideias repetidas de livros anteriores, e a inexplicável escolha das notas de rodapé, que acabam por prejudicar o ritmo da leitura. O isco do livro era uma reflexão sobre a criação, mas até o próprio Auster já fez muito melhor, por exemplo no livro Da Mão Para a Boca. Uma desilusão, resumindo.
Nos últimos tempos, li um livro que, apesar de se inspirar no estilo de Paul Auster, consegue ser mais interessante do que A Noite do Oráculo. Já falei dele, é O Livro dos Homens Sem Luz, de João Tordo. Uma cópia melhor do que este original, próxima do espírito de livros como a Trilogia de Nova Iorque ou A Música do Acaso. Apenas espero que Paul Auster regresse à boa forma, porque eu continuo com saudades dele.
A Noite do Oráculo, de Paul Auster, foi editado pela ASA.