Nem todas as notícias
são tão negras como as que falam da
alegria alheia;
há dias em que as páginas dos jornais
se enchem de desgraças, e
apesar da luz da manhã parecer a mesma - a mesa
sobre a cidade, o café arrefecendo à tua frente,
os óculos pousados no livro - as vidas que ali se imaginam
pesam, e pesam a sério, como o
tempo o fez na nossa história.
Numa folha se descreve o efeito
da velocidade na matéria - e dizem que se pode
encontrar deus brevemente; eu acredito, de passagem,
nele que se senta à nossa mesa
e nos crava um cigarro, rosto queimado
enfiado na gola de um casaco temporão.
Coloca as mãos sobre a fórmica,
e espero que a conversa não dure mais do que o suficiente
- imaginar-lhe um corpo e uma voz, as roupas que possa vestir,
usá-lo como personagem de um poema coxo
que fale do cansaço das coisas mais básicas, o oposto
da incompreensão com que os jornais diariamente se deparam:
essa matéria volátil,
os quarks, os protões, os electrões,
rodopiando em redor de um núcleo inexistente; tudo tão feito
de nada como o deus que se sentou à nossa mesa, a mesa,
a manhã que desaparece, o jornal e as tragédias comezinhas,
nada onde uma certeza apenas existe;
e bem gostava eu que não fosses tu. Mas és.
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