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Os nomes


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Terêncio Leonardo aspirava a ser chamado de Igor Alexeinov, e desse modo tornar-se personagem de um grande romance russo ou então de um conto escrito por um qualquer escritor português da nova vaga. Terêncio também aspirava uma vez por semana a casa, quando a isso estava obrigado pela divisão equitativa das tarefas domésticas, imposição de sua esposa, que não era nem Norberta nem Joaquina, simplesmente Maria De Jesus, nascida e criada em plena Lisboa do final do século XX, e por isso habituada a lidar com os homens como ensinam nas revistas femininas - apesar de nunca as ler e de preferir livros de psicologia surripiados das prateleiras das livrarias. Terêncio aspirava, de bom grado, enquanto à noitinha Maria o mantivesse ocupado, mas o resto do tempo suspirava pelos cantos desempoeirados da casa, sonhando ser Igor, príncipe russo deslocado para a frente de batalha, cego em combate e regressado, depois de perdida toda a esperança, aos braços frios de uma Ekaterina Alexandrovna alva e de olhos claros, olhos que se teriam perdido entretanto por um arrivista trapaceiro, cujos únicos encantos eram a voz maviosa e uma certa propensão para dizer a verdade nos momentos certos. 
Até que um dia acordou numa trincheira, antes de um bombardeamento inimigo, e ficou cego do olho esquerdo e vesgo do direito. Regressou a casa, aos braços frios de Ekaterina Alexandrovna, alva e de olhos claros vendados à desgraça do seu Igor, perdida de amores por um trapaceiro arrivista que, ao ser apresentado a Igor, disse: "O regresso de um homem morto nunca é uma boa notícia". 
Mais tarde, enquanto numa esquina de São Petersburgo esperava que um estranho de passagem depositasse uma moeda na planura crespa da mão, sonhava com o dia em que poderia pegar num aspirador e limpar a casa, morna e estável, tão morna e tão estável como o corpo engordado de uma mulher moderna, o corpo que apenas lhe pedia que limpasse a casa a troco de uma foda, e nunca outro tipo de heroísmos.

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