Inês, no seu esplendor juvenil, preparando-se para ir para o liceu, vai vestindo as peças de roupa, lânguida e atempada, cuecas brancas primeiro, depois jeans apertados, realçando as coxas, escolhe uma camisola justa cor-de-rosa fluorescente dizendo: just for girls, e senta-se em frente ao espelho, escovando um cabelo preto que lhe chega até aos ombros, um carvão luzidio reflectindo-se no espelho, um sorriso nos lábios, hoje sonhou com o Fábio, e isso deixou-a feliz para o resto do dia. Antes de se levantar esteve vinte minutos masturbando-se debaixo dos lençóis, e em cada orgasmo que teve pensou, mesmo antes de ser tomada pela vaga final, que estava a ser possuída por Fábio, de pernas abertas. Depois, quando começou a relaxar, um leve sentimento de culpa tomou conta dela, só desaparecendo quando engoliu meia caixa de chocolates que estava guardada dentro da gaveta da sua mesinha de cabeceira, sempre prontos para aquelas ocasiões. Enquanto se veste, as ideias começam a revoltear no espírito: que dia é hoje? Pensa: é o dia da interrupção, e eu ontem tomei a merda da pílula. Pergunta-se a si própria se aquilo poderá ter algum efeito perverso, e decide que irá falar com o seu professor de Biologia, só para ver ele corar até às orelhas, gozar com aquele ar de alguém que acabou de fazer algo de errado. O professor de Biologia, pensa, escanzelado e lívido, todo enfiado como um pau seco naquelas roupas largas de mais, mas ele é giro, ainda, os olhos azuis, pensa e sorri sem se dar conta, escovando os cabelos pretos caídos sobre os ombros, e quando sacode a cabeça e se levanta, volta a ser possuída, desta vez por uma certa graça juvenil, é natural que metade dos rapazes da turma a cortejem, assim mesmo, à antiga, e a outra metade se faça descaradamente a ela, piropos no recreio e apalpões nos corredores, linguados atrás do barracão da educação física. Mas Inês não é uma jovem; a ingenuidade e a inocência são perversões na cabeça de homens com poucos escrúpulos e muita fanfarronice para oferecer, como qualquer adolescente de agora ela passa pela vida colhendo mais do que o dia.
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